Embora tenha se tornado quase um acessório de moda entre os adultos, o parzinho de lentes ainda afasta os pequenos
Você percebe os olhinhos espremidos em frente à televisão, leva o seu pequeno ao oftalmologista e sai de lá com uma receita para óculos e com aquela preocupação. "Ele não vai usar de jeito nenhum", logo pensa ou comenta em casa - e é aí que pode estar o começo de uma longa rejeição pelo parzinho de lentes. "O motivo da resistência que muitas crianças têm ao uso dos óculos está mais ligada ao desejo de corresponder à expectativa dos pais e familiares do que à necessidade de ser igual aos outros, especialmente na fase escolar", diz Roberta Bento, especialista em aprendizagem baseada no funcionamento do cérebro pela Universidade da Califórnia e Duke University, nos Estados Unidos; e em aprendizagem cooperativa pelas Universidades de Minnesota e de San Diego, também em território americano.
Segundo a especialista, atualmente essa má impressão passada pelos pais é até mais impactante nos pequenos do que a reação dos amigos na escola. "Pergunte para os pais ao seu redor como acham que o filho reagiria à notícia de que precisa usar óculos. A primeira reação dos responsáveis é 'ih, ele não vai usar!'. Eis aí a semente da rejeição plantada no cérebro da criança", explica Roberta, que acrescenta: "A mensagem acaba sendo negativa e ela entende, ainda que de forma inconsciente, que aquilo deve ser mesmo muito ruim".
Mas a boa notícia é que, se influenciamos tanto os filhos, podemos fazer isso também de forma positiva ao tratar a novidade como algo bom. Dar a notícia à criança e falar sobre ela com os familiares com entusiasmo é essencial, afinal, os óculos representam a solução para diversos problemas (em alguns casos, até mesmo para o baixo desempenho escolar!). "É fundamental que esse entusiasmo seja autêntico e os argumentos concretos são a cereja do bolo", diz Roberta. "Para uma criança menor, os pais podem dizer que agora ela terá um superpoder que poucos possuem ou, se alguém em casa já usar, dizer que ela terá um superpoder igual ao do papai/mamãe/irmão. Se já estiver mais velho, um bom caminho é perguntar se ele quer levar um amigo para escolher a armação ou se quer se inspirar em seus ídolos, pesquisando modelos na internet", aconselha.
O papel do professor
E se entre os jovens adultos os óculos já passaram a funcionar quase como um acessório de moda, entre os pequenos, apelidos como "quatro olhos" e "fundo de garrafa" ainda impulsionam o bullying. Por isso, ainda que os pais tratem a novidade da melhor forma possível, é importante que os professores ajam da mesma maneira. "Eles podem ajudar bastante, principalmente no início, quando os óculos ainda não foram assimilados como parte integrante do dia a dia", orienta a especialista, que lembra a importância da reação adequada à faixa etária de seus alunos. "No caso dos pequenos, o elogio perante toda a sala de aula contribui ao reforçar a ideia de que ele se destaca de forma positiva agora que usa óculos. Já nas turmas de pré-adolescentes, o comentário do professor deve ser em particular para evitar o que eles chamam de 'mico''", diz Roberta.
Escolhendo o modelo
Além da rejeição inicial aos óculos por se achar feio ou diferente com eles, há o incômodo por ter um acessório novo e ainda pouco confortável no rosto numa fase da vida em que a movimentação é intensa. É preciso lembrar também que correr e brincar sem preocupações faz parte da infância, então vale pensar nisso na hora de escolher o melhor modelo. "Normalmente, a criança não toma muito cuidado com os óculos e, por isso, sugere-se armações mais resistentes e/ou maleáveis, como acetado ou silicone/nylon", explica o oftalmologista Fabio Pimenta de Moraes, especialista oftalmopediatria e estrabismo do Hospital de Olhos Paulista. "Também é importante observarmos a adaptação dos óculos no rosto da criança, que ainda não tem a base nasal completamente desenvolvida e, portanto, nem tem muito apoio. Por isso, precisamos pensar em fitas que mantenham os óculos firmes por trás da cabeça e nos ajustes que devem ser feitos na própria armação", destaca.
Ainda de acordo com o oftalmo, os óculos de nylon flexíveis são mais fáceis de encontrar e, em geral, são mais seguros. "Caso a criança faça atividade física frequentemente, é possível adquirir óculos fabricados especificamente para a prática esportiva que são mais resistentes e têm uma espuma na parte interna", acrescenta Moraes.
Entretanto, embora às vezes pais e professores se esforcem, os pequenos realmente não aceitam os óculos e, se isso acontece ainda nos primeiros anos, pode acarretar prejuízos para a vida toda. "Caso a criança seja nova e ainda não tenha desenvolvido completamente sua capacidade visual, a falta de óculos pode levar a um desenvolvimento incompleto", esclarece o médico. Se o seu filho já for maiorzinho, porém, o fato de não usar óculos não vai gerar mais problemas com a visão em si (não há comprovação de que o uso correto iniba os avanços do grau ou que a falta de uso o faça aumentar), mas não é o ideal. "A criança pode enxergar embaçado e ter dificuldades no dia a dia pela visão aquém do normal, então não é recomendado deixá-la sem a correção adequada, até mesmo porque a maior parte da informação que chega ao ser humano decorre da visão", finaliza o médico.
Para incentivar
Quando pensamos no bem dos nossos filhos, vale (quase) tudo para incentivá-los. Foi isso que Rita Lisauskas fez quando seu pequeno começou a usar óculos aos 6 anos idade. Para mostrar a ele que usar o par de lentes poderia ser legal, a jornalista criou uma página no Facebook pedindo que outras pessoas enviassem suas fotos ou de seus filhos usando o acessório. A página Samuca de Óculos já saiu do ar, mas certamente ajudou o filho de Rita e várias outras crianças inseguras com a novidade.
E se você não quer ir às redes, pode ter alguma iniciativa entre amigos e familiares mesmo. O importante é que a criança desenvolva pouco a pouco o hábito de usar os óculos todos os dias e, para isso, ela precisa se sentir bem com o novo acessório. [Texto Extraído do portal Educar para Crescer]
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