Para o governo, aprová-la se tornou questão de sobrevivência.
O presidente Michel Temer pode começar a se preparar para a derrota na reforma da Previdência. Mesmo fazendo o que sabe fazer melhor – negociar –, ainda não conseguiu convencer 308 deputados a aprovar o já desidratado texto da Proposta de Emenda Constitucional 287. Seja qual for o resultado em plenário, já perdeu – e o país também.
Temer teve de adiar os planos de votação na tentativa de angariar apoio. Tudo o que angariou foram deserções. O tempo funciona contra ele. O PSB anunciou ontem que sairá do governo por oposição às reformas trabalhista e previdenciária. PTB e PPS estudam fazer o mesmo. Centrais sindicais convocaram greve geral para sexta-feira. A maioria da população é contra a reforma.
Para o governo, aprová-la se tornou questão de sobrevivência. É preciso transmitir ao mercado um recado de que a agenda econômica continua andando, apesar da crise política sem paralelo desencadeada pela delação premiada da Odebrecht e da indefinição no cenário eleitoral para 2018.
Verdade que, diante do descalabro da Previdência, alguma reforma é melhor que nenhuma reforma – mas não qualquer reforma. Aprovar uma emenda constitucional frouxa, que sirva apenas para polir a imagem de um governo atingido por denúncias gravíssimas só piora a situação. As denúncias não sumirão, e as deficiências da reforma ficarão evidentes.
Não parece haver como o governo sair ileso. Já cedeu em pontos críticos: as previdências estaduais e municipais, a distinção entre homens e mulheres, as regras de transição, o acúmulo de benefícios como pensões, a manutenção de aposentadorias especiais para professores, policiais e militares, além da manutenção das regras do programa de assistência social BPC. Ameaçou quem votar contra com a perda de cargos e ministérios.
Apesar de tudo isso, no Congresso ferido pela Operação Lava Jato, o apoio a Temer se esvai. De acordo com levantamento do jornal O Estado de S.Paulo, apenas 75 deputados apoiam a reforma da Previdência, e 275 são contra. Faltam, portanto, 233 votos para a aprovação. Se Temer não os obteve até agora, cedendo em tudo o que já cedeu, ameaçando tudo o que já ameaçou, que garantia tem de conseguir? Nenhuma.
Mesmo que consiga, o país sairá perdendo. Na tentativa de equilibrar a demanda política e a pressão econômica, o risco é não atender nenhuma das duas. Desde o início, todos sabiam do perigo. Agora, já deixou de ser um cenário hipotético para se tornar provável.
O custo das mudanças na reforma permanece um mistério. Quem sabe fazer contas fala em perda de até 60% de economias inicialmente estimadas em mais de R$ 800 bilhões nos próximos dez anos. Os otimistas dizem que a perda é menor e não chega a R$ 250 bilhões.
Seja lá quem tenha razão, um fato é inescapável: as contas da Previdência estão tão fora do controle, que será impossível conter a expansão do déficit, e outra reforma se fará necessária daqui a alguns anos. Tudo o que os protestos contra podem conseguir é manter direitos ilusórios, com prazo de validade. Mas o objetivo real – enfraquecer o governo – terá sido atingido.
Por ora, o mercado financeiro parece acreditar nos poderes de Temer. Os sinais de recuperação econômica são concretos. Investidores voltam a cobiçar o Brasil – o leilão de novas linhas de energia arrecadou ontem R$ 12,7 bilhões. A inflação desabou. As perspectivas para o futuro são positivas, tanto no nível de emprego quanto na atividade econômica. Tudo isso é verdade.
Mas tudo pode ir por água abaixo se for impossível cumprir o teto constitucional de gastos públicos. É preferível fazer isso de modo ordenado e planejado a esperar o caos se manifestar. Por isso a reforma da Previdência é tão essencial. A alternativa é o descontrole orçamentário e uma situação de calamidade. Basta olhar para o Rio de Janeiro para saber o que aguarda o Brasil.
Por Helio Gurovitz/G1
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